Intervenção de Isabel Camarinha no aniversário da CGTP-IN

Caros convidados, camaradas,

A todos saúdo calorosa e fraternalmente neste dia em que a nossa Central completa 50 anos!

Começo por agradecer a presença do Sr. Presidente da Fundação do INATEL pelo apoio dado à realização desta iniciativa.

Saúdo todos os camaradas, aqueles que já assumiram tarefas no Movimento Sindical, trabalhadores e dirigentes, e os que hoje, representantes de todos os trabalhadores nos sindicatos, uniões e federações, desempenham esta desafiante e estimulante actividade de os esclarecer, ouvir, organizar e mobilizar para a luta pelos direitos, pela justiça social, pela transformação.

Comemoramos hoje os 50 anos da CGTP-IN e o passo dado nesse dia 1 de Outubro de 1970 de convocar uma reunião com cerca de duas dezenas de sindicatos para a defesa da contratação colectiva, do horário de trabalho, a exigência da liberdade de reunião e o fim da censura.

Foi o culminar de um longo processo de resistência e de luta, de recuos e de conquistas, que o movimento operário e todos os trabalhadores desenvolveram desde o século XIX, que atravessou a primeira república e nunca parou mesmo perante a ingerência, a repressão e a tortura de que foram alvo os sindicalistas e os trabalhadores que lutaram durante o fascismo.

Uma história de intervenção e luta decisiva para criar as condições para a Revolução de Abril e para as profundas transformações alcançadas, que abriram novas perspectivas para o país e que ficou profundamente marcada pelos avanços nos direitos e interesses dos trabalhadores.

A todos os que não desistiram e não se calaram perante a injustiça, aos que resistiram à contra-ofensiva do capital no final dos anos 70, nos anos 80 e 90, a nossa homenagem! É no seu exemplo, na gloriosa tradição de organização e de luta dos trabalhadores portugueses, que radicam as raízes e a natureza deste movimento sindical.

Um movimento sindical de classe, porque reconhecemos a luta de classes como elemento determinante na evolução histórica da Humanidade e assumimos “o aprofundamento da democracia, o desenvolvimento económico, social, cultural, ecologicamente sustentado” porque é nosso objectivo central a defesa dos interesses dos trabalhadores.

Porque somos uma central sindical de classe, temos como valores superiores e universais a promoção da paz e dos direitos Humanos, num tempo em que impera a guerra, cresce a barbárie e se desenvolve o ataque à autodeterminação e soberania dos povos.

Da nossa natureza, que molda a forma como nos organizamos, emanam os princípios que desde a fundação guiam a nossa acção:

O princípio da unidade, porque os sindicatos da CGTP-IN estão abertos e apelam à participação de todos os trabalhadores, representam os seus interesses individuais e colectivos, estejam ou não sindicalizados, “quaisquer que sejam as suas opções políticas ou religiosas, sem discriminação de sexo ou de orientação sexual, raça, etnia ou nacionalidade”, “independentemente da diversidade das suas profissões, qualificações, situação social e vínculo laboral.”.

Unidade na acção, com base na defesa intransigente dos direitos e interesses dos trabalhadores.

O princípio da democracia, participada e vivida pelos trabalhadores, entendida como um direito e um dever, sempre com o “respeito integral pelas decisões maioritariamente expressas”.

Da independência, que combate todas as tentativas de ingerência como condição para o reforço da sua própria unidade.

Da solidariedade, de classe e internacionalista, valores que nos são intrínsecos, combatendo o egoísmo individualista e corporativo que o capital tenta incutir para manter o seu domínio.

O princípio do sindicalismo de massas, de todos os trabalhadores, numa mobilização e intervenção que assume “diversas formas de luta pela defesa dos seus direitos e interesses e pela elevação da consciência política e de classe”.

É o desenvolvimento destes princípios interdependentes, é a nossa natureza de classe, que dá forma aos objectivos programáticos pelos quais lutamos e que encontram nos valores, ideais e conquistas de Abril uma referência incontornável nos quais se alicerça a defesa da identidade e soberania de Portugal, lutando contra a ofensiva aos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores.

Objectivos que passam pelo aprofundamento da democracia em todas as suas amplas dimensões, na qual os direitos dos trabalhadores “são parte integrante e indispensável”, o que obriga a uma acção permanente, e o desenvolvimento de “um sindicalismo de intervenção e transformação, com a participação dos trabalhadores, na luta pela sua emancipação e pela construção de uma sociedade mais justa e fraterna, sem exploração do homem pelo homem”.

Desde a sua fundação, a CGTP-IN teve um papel destacado em todas as conquistas alcançadas pelos trabalhadores. Daquele 1º de Maio de 1974, que dias após o 25 de Abril, deu impulso ao processo revolucionário e demonstrou a força do povo unido; dos avanços na Reforma Agrária, no controlo operário das empresas, das nacionalizações que colocaram na esfera pública empresas essenciais ao desenvolvimento do país, do poder local democrático, são inúmeros os exemplos da acção transformadora dos trabalhadores.

Uma acção que conduziu ao direito e à fixação do SMN, que erradicou o trabalho infantil, que consagrou as 40 horas e importantes direitos laborais.

Exemplos que se estendem ao da escola pública que ensinou a lêr um povo que o fascismo mantinha com elevado grau de analfabetismo; do SNS que levou a saúde a todo o país e tirou Portugal da lista onde mais recém-nascidos morriam sem nunca serem crianças; da protecção social que não existia para a maioria; da justiça e da cultura a que o povo não tinha acesso.

Uma luta que esteve presente nos avanços e contribuiu para travar os retrocessos no período contra-revolucionário, que faz com que, ainda hoje, se mantenham muitos dos direitos e conquistas de Abril, com o capital, 46 anos depois, sem conseguir completar o ajuste de contas.

Uma luta que contou com 10 Greves Gerais, milhares de concentrações e manifestações, que incluem poderosas manifestações e concentrações nacionais, milhares de lutas nas empresas, em todos os sectores e em todo o país.

Este legado, as nossas raízes, natureza, princípios e objectivos – a identidade deste poderoso colectivo, é um elemento de confiança para os desafios com que os trabalhadores, o povo e o país se debatem no momento actual.

Camaradas,

Vivemos um tempo em que a situação internacional é marcada pelo agravamento da exploração. Potenciando as condições existentes, o capital procura ainda tirar partido dos avanços na ciência, em si fruto do trabalho, para acentuar o condicionamento, na vida e na prestação de trabalho, dos assalariados.

No plano interno, foram as opções de sucessivos governos, do PS, PSD, com ou sem o CDS, que trouxeram os problemas estruturais com que o país e os trabalhadores estão confrontados.

Vivemos um tempo onde emergem problemas acumulados, que exigem uma resposta firme uma ruptura, uma opção de classe ao lado de quem trabalha e trabalhou. A mesma política, feita ao serviço dos mesmos interesses, vai produzir os mesmos resultados, os mesmos estrangulamentos e o agravamento dos problemas estruturais.

As opções do governo do PS, no quadro das respostas imediatas à epidemia, mas também naquilo que o país precisa para o futuro, estão longe de responder às necessidades, de fazer a ruptura com a política de subordinação ao capital, de criar condições para o desenvolvimento soberano, robusto, justo e sustentável do país.

Quando se fala de unanimidade, de amplo consenso nacional, de que “estamos todos no mesmo barco”, questionamo-nos em torno de quê querem a unanimidade e o consenso?

É em torno do barco da precariedade, onde se afunda o futuro dos jovens trabalhadores, dos trabalhadores que são mantidos nesta situação durante anos e anos afim, que adiam projectos pessoais, que vêem negado o direito ao trabalho com direitos e têm de emigrar para encontrar lá fora o que é negado cá dentro?

Querem a unanimidade para manter e acentuar os baixos salários, para que a CGTP-IN entre num barco comandado pelo grande patronato que rema em sentido contrário ao desenvolvimento do país, que se opõe sempre a todas e quaisquer melhorias nas condições de trabalho e de vida daqueles que representamos, que ameaça com o desemprego e as falências, com alguns a considerarem “criminosa” e o governo a por travão, a uma já de si insuficiente subida do SMN?

Querem consenso para manter as normas da legislação laboral que dão ao capital o poder de fazer caducar as convenções e parte dos direitos, para fazer da contratação colectiva um instrumento que consagra direitos abaixo da Lei? Para impor e alterar horários de trabalho? Para aceitar os bancos de horas, a laboração contínua em nome do lucro que ataca a saúde dos trabalhadores, o trabalho por turnos, ao Sábado, Domingo e feriados?

Sim, é verdade que este coronavírus é uma realidade nova, externa à organização económica e social, mas não é menos verdade que foram décadas de opção pela política de direita que nos deixam agora mais expostos.

Impõe-se outro caminho!

É hora de valorizar o trabalho e os trabalhadores! É hora de mobilizar e esclarecer quem trabalha, de ouvir as suas preocupações, de debelar o medo incutido para retirar direitos e justificar o aumento da exploração.

É hora de avançar nos direitos, nos salários, no reforço do papel do Estado e no aumento e diversificação da produção nacional

É por isso que exigimos o aumento geral dos salários em 90€ e a fixação do SMN nos 850€ no curto prazo.

O aumento geral dos salários é fundamental para que os trabalhadores possam aceder a bens e serviços de que hoje estão privados.

Mais salário para combater a situação em que hoje, 1 em cada 10 trabalhadores, apesar de trabalhar, se encontra na pobreza; ou, ainda mais gritante, para tirar desta situação uma em cada 5 crianças no nosso país, que são pobres porque aos seus pais é negado trabalho com direitos e um salário digno.

Mais salário, para combater as desigualdades na distribuição da riqueza entre o capital e o trabalho!

Mais salário dinamiza a economia, possibilita às empresas vender mais, criar emprego e reduzir o desemprego, com efeitos directos na Segurança Social.

Mais salário, para evitar que se caia numa espiral recessiva como aquela que o PSD e o CDS impuseram com ajuda da decrépita UE e do FMI, e nós, com a nossa luta, ajudámos a derrotar.

É possível, é necessário, é urgente esta nossa luta pelo salário!

A valorização do trabalho e dos trabalhadores passa, também, pelo combate à praga da precariedade, que destrói a esperança, mina a confiança e faz adiar projectos de vida.

A revogação das normas gravosas da legislação laboral, que permitem e fomentam a precariedade, que degradam as condições de trabalho, que condicionam e desvirtuam a contratação colectiva com a negação da reposição do princípio do tratamento mais favorável e a caducidade das convenções é uma reivindicação de que não abdicamos. Precisamos de uma lei do trabalho que proteja de facto os trabalhadores.

Trata-se de opção política, de opção de classe. Ou se está do lado do capital que quer a individuação das relações de trabalho e o aumento da exploração, ou do lado dos trabalhadores. Não há meio termo e o PS - mais uma vez em convergência com o PSD e o CDS - com as últimas alterações que introduziu na legislação laboral voltou a privilegiar o patronato!

Alterações que criaram mais mecanismos para os patrões precarizarem com o período experimental de 6 meses e para desregularem os horários de trabalho, com novas adaptabilidades, com o banco de horas grupal, sempre na perspectiva que o trabalho e os trabalhadores têm de se moldar às exigências da maximização do lucro. Não aceitamos!

Com os avanços tecnológicos existentes, em si fruto do trabalho, é inconcebível esta desregulação dos horários e que não haja uma redução do tempo de trabalho para as 35 horas! A sociedade como um todo e em particular os trabalhadores, têm de ser os destinatários dos avanços na ciência. Não aceitamos o aumento das desigualdades, da exclusão laboral e social que o capital quer incrementar.

O que se exige é que haja redução do tempo de trabalho, a redução para as 35 horas que reivindicamos.

Para a melhoria das condições de vida e de trabalho e para o desenvolvimento do país o que se exige é a libertação das imposições da UE, e da sua política que tão bem serve o grande capital, mas tão mal trata o interesse nacional!

Será a luta, a mobilização e esclarecimento dos trabalhadores, a sua sindicalização e organização nos nossos sindicatos de classe, o elemento central para a transformação social.

Uma luta que temos vindo a desenvolver e precisamos de intensificar. Uma luta que conheceu no 1º de Maio deste ano um momento alto, de firmeza e combatividade, de exigência das respostas que tardam para assegurar salários e emprego, garantir o presente e lançar as pontes para o futuro.

Um 1º de Maio que abriu as portas ao desenvolvimento da luta nos locais de trabalho onde os direitos estão a ser atropelados, levou o protesto para o sector público e o privado, que demonstrou que a CGTP-IN está sempre onde tem que estar, com os trabalhadores, pelo avanço nos direitos!

Deste crescendo da acção dos trabalhadores, realizámos uma Semana Nacional de Luta que levou para as empresas e para rua a voz do trabalho. A voz do trabalho, a exigência de uma resposta imediata, seja no plano dos direitos, dos salários e das condições de saúde e segurança, seja de um novo rumo para o país, convergiram nas acções que em 19 localidades fizeram do dia 26 de Setembro um dia de Luta Nacional.

Será a nossa acção e solidariedade o melhor contributo para luta dos povos em todo o mundo pela paz, progresso e justiça social.

Será a unidade entre todos os trabalhadores, o tomar nas nossas mãos a defesa e valorização do trabalho e dos trabalhadores, que possibilitará a conquista de um País desenvolvido e soberano.

É esta a nossa história, a história da CGTP-IN que há 50 anos nasceu por vontade dos trabalhadores, brotou dos locais de trabalho e organizou a poderosa força dos trabalhadores.

Uma história feita por gerações e gerações de trabalhadores, que lutaram e lutam pelos direitos e por um novo futuro.

Uma história onde foram muitos os camaradas que desempenharam um papel central.

Não podendo citar todos os que aqui hoje estão presentes, refiro simbolicamente o Daniel Cabrita, Armando Teixeira da Silva, Manuel Carvalho da Silva e o Arménio Carlos e muitos outros desempenharam um papel central.

Uma história de que nos orgulhamos, que afirmamos e projectamos com os valores de Abril no futuro de Portugal.

VIVA A CGTP-IN!