FNAM pede inconstitucionalidade da norma sobre trabalho suplementar dos médicos nas urgências
A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) solicitou ao Senhor Presidente da República, à Senhora Provedora de Justiça e à Senhora Procuradora-Geral da República que requeiram ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade da norma constante do artigo 38.º da Lei n.º 12/2022, de 27 de junho (Orçamento do Estado para 2022), que instituiu um regime excecional de trabalho suplementar médico para assegurar os serviços de urgência dos serviços e estabelecimentos de saúde integrados no Serviço Nacional de Saúde.
Para a FNAM, não há dúvidas sobre a inconstitucionalidade da norma, por não respeitar, pelo menos, o artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), sobre o direito de conciliação da vida profissional com a vida pessoal, o direito à prestação de trabalho em condições de segurança e saúde e o direito ao repouso e lazer, a um limite máximo da jornada de trabalho e ao descanso semanal.
Ao poder obrigar os médicos a trabalharem muito para além de 150 horas anuais de trabalho suplementar – limite que se encontra definido legalmente, na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas e no Código do Trabalho – deita-se por terra todo e qualquer respeito pela sua vida familiar e pelo seu direito ao repouso e ao lazer, impondo-lhes o trabalho infinito, sem limites e sem direitos.
O artigo 59.º da CRP também prevê a existência do dever de fixação, a nível nacional, dos limites da duração de trabalho, que são ultrapassados com esta norma, e do dever de proteção especial do trabalho prestado em condições de risco e penosidade, que não se encontra salvaguardado.
O trabalho em serviço de urgência é uma atividade que exige uma resposta permanente a várias e diferenciadas situações de doença súbita ou aguda. A elevada complexidade e responsabilidade do trabalho médico no serviço de urgência é um trabalho de especial exigência, geradora de elevados níveis de cansaço, de desgaste e de stress.
Por isso, a FNAM considera incompreensível que para o Governo seja viável a acumulação de mais cansaço, de um maior desgaste e de mais stress sobre os médicos dos serviços de urgência, em particular depois do trabalho feito durante a pandemia de COVID-19.
Assim, a norma do Orçamento do Estado para 2022 viola ainda o n.º 1 do artigo 64.º da CRP, por colocar em causa o direito à proteção na saúde dos utentes, podendo potenciar o risco de ocorrência de erros e falhas técnicas, devido ao nível de cansaço e exaustão, durante os cuidados médicos nos serviços de urgência do Serviço Nacional de Saúde.
Não é com este tipo de medidas que o Governo vai conseguir fixar os médicos no SNS. Para isso, é urgente que o Ministério da Saúde queira revalorizar a carreira médica e respeite a especialização médica.
Fonte: FNAM