TAP: A fobia das obras e a dificuldade em descolar

Estão, por esta altura, a completar-se dois anos desde que se abateu sobre a aviação mundial a maior crise de que há memória, e que obrigou, praticamente, todos os governos da Europa e até do mundo, a intervirem para salvar as respetivas companhias aéreas das inevitáveis falências.

Na TAP não foi diferente. Levou, por um lado, à alteração da composição acionista da companhia, com o Estado a subscrever a totalidade do capital, e por outro, teve ainda a insólita e injusta particularidade de aproveitar a grande fragilidade em que os trabalhadores se encontravam, para lhes impor que pagassem a crise, e pior ainda que fossem eles os únicos a pagá-la.

Chegados à entrada do verão IATA, quando estamos a atingir o ocaso dessa pandemia, fazia sentido para nós, trabalhadores, que a prioridade do esforço, incluindo o esforço económico e financeiro, fosse dirigido para a retoma da operação, sem descurar, obviamente, outros setores como por exemplo a M&E que, como se sabe, tem a seu cargo a importante missão de garantir a segurança, a operacionalidade e a fiabilidade da frota.

É, pois, neste contexto que nos surpreende e nos violenta a facilidade com que se delapidam recursos – dolorosamente conseguidos à custa do sacrifício dos trabalhadores – em obras várias, desde as megalómanas para instalar a UCS fora do reduto, passando pelas sempre provisórias do IOCC, até às atuais aberrações de plantar cancelas e torniquetes em tudo quanto é sítio pelo reduto TAP, como se dessas cancelas e torniquetes dependesse a atividade da empresa. Tudo isto roça o insulto a quem diariamente é espoliado de parte do seu salário.

Já antes abordámos o tema daquilo a que – para não utilizar adjetivos mais fortes – chamamos a “excentricidade da Comissão Executiva,” e as atuais circunstâncias obrigam-nos a retomá-lo. Por muitas “lives e talks” que façam, por mais “shows” que promovam em confortáveis hotéis, e por mais poliglotas que demonstrem ser, há circunstâncias que não mudam, e têm que ser tidas em conta.

Estamos na TAP, empresa pública nacional, que durante o ano de 2021 promoveu uma das maiores destruições de emprego levadas a cabo em Portugal, além de ter imposto também o primeiro despedimento coletivo numa empresa pública. Nunca é demais lembrar que no passado ano de 2021, foram atirados borda fora cerca de 3.000 trabalhadores de todas as categorias profissionais e de todos os níveis de responsabilidade, incluindo quadros superiores, todos portugueses. É curioso ainda lembrar, que a principal razão para tal sangria foram, confessadamente, os custos com pessoal, que é como quem diz, a folha salarial. Bom, mas então as dezenas de contratações de quadros superiores, a maioria estrangeiros, para além de alguns “afilhados,” que vieram substituir os portugueses que foram despedidos, não carregam essa folha salarial?

Em contrapartida, vamos assistindo com um misto de espanto, incredulidade e revolta aos tais “talks” anunciando-nos que essa coisa de os trabalhadores terem um salário é coisa que já não se usa, que agora com as “modernices” os salários já não se pagam com euros. Agora os trabalhadores – portugueses – da TAP serão pagos com cartões carregados com gratidão por terem um posto de trabalho, e com muitas estrelas e abracinhos.

Acresce que, enquanto se realizam todas estas tentativas de desvalorizar a importância da representação sindical se vão acumulando sucessivos atropelos ao AE, desde atraso de meses no pagamento do trabalho suplementar até à violação grosseira do simples direito de marcar férias, passando por tantas outras que, obviamente, terão que acabar.

Cuidem-se aqueles que chegados recentemente à empresa se esforçam por “vender” esses tiques aventureiristas certamente assimilados nalguma instância dedicada ao voluntariado. Cuidem-se, também, aqueles outros que vão tentando passar a ideia de que na “nova TAP,” como gostam de dizer, não há mais lugar para a reposição dos salários completos, e para pôr fim aos injustos cortes salariais.

O que acreditamos, e com muita convicção, é precisamente o contrário. É que não só os cortes acabarão e os salários serão repostos, como isso acontecerá bem mais cedo do que pensam. E se acham que há excesso de custos de pessoal então devem procurá-lo noutro lado. Quanto aos trabalhadores de terra que representamos, o que dizemos é que estes continuam a pagar uma pesadíssima fatura, e é tempo de os aliviar de tal fardo.

O Acordo Temporário de Emergência que o Governo, sob ameaça, nos forçou a subscrever é muito claro. Diz logo no seu preâmbulo que os trabalhadores aceitam rever, temporariamente, algumas das suas condições de trabalho, exclusivamente enquanto existirem constrangimentos provocados pela pandemia da COVID-19.

É bom que se tenha em mente que os violentos cortes salariais, que continuam a ser praticados, além de em nada aproveitarem para a empresa são inaceitáveis instrumentos de humilhação para os trabalhadores, e desonram aqueles que, tendo consciência disso, deles se aproveitam.

Já antes o afirmámos e voltamos a lembrá-lo: um corte num grande salário apenas retira parte do excedente, enquanto que esse mesmo corte num salário mais pequeno lhe retira uma parte do necessário para manter a dignidade. A TAP não recuperará da pandemia maltratando os trabalhadores, aliás nenhuma empresa sobreviverá hostilizando os seus trabalhadores.

Fonte: SITAVA