As famílias açorianas continuam a ser empurradas para situações de pobreza real, porque os rendimentos do trabalho dos membros do agregado familiar não são suficientes para garantir a sua subsistência. O efectivo exercício da contratação colectiva deveria ser a mola impulsionadora para alterar o actual paradigma laboral e o melhor instrumento de progresso social. Mas o patronato recorre a todas as formas de boicote ao exercício de negociação colectiva e, em alguns casos, os contratos celebrados por sindicatos não filiados na CGTP-IN levaram mesmo à perda de direitos.
O estado da contratação colectiva nos Açores foi o principal tema do documento distribuído ontem à imprensa, no arranque da Semana Nacional de Luta da CGTP-IN, pela União dos Sindicatos de Angra do Heroísmo e pelo Sindicato das Indústrias Transformadoras, Alimentação, Comercio e Escritórios, Hotelaria e Turismo dos Açores:
Semana de luta de 22 a 26 de junho
Contratação Coletiva nos Açores
Para a União dos Sindicatos de Angra do Heroísmo (USAH) e para o Sindicato das Indústrias Transformadoras, Alimentação, Comercio e Escritórios, Hotelaria e Turismo dos Açores (SITACEHT/Açores), a contenção salarial generalizada e as reduções salariais, com a subsequente redução do rendimento disponível têm, nos Açores, um efeito ainda mais profundo e negativo, considerando a grande disparidade entre os rendimentos dos trabalhadores açorianos e os de outras regiões do País. Cresce a desigualdade de que são vítimas os trabalhadores açorianos, que têm de suportar também um custo de vida agravado pela insularidade e agora pelo turismo, com rendimentos reduzidos, aumentando assim a disparidade remuneratória, com prejuízo para coesão social nacional.
As famílias açorianas continuam a ser empurradas para situações de pobreza real, porque os rendimentos do trabalho dos membros do agregado familiar não são suficientes para garantir a sua subsistência.
Reafirmamos, a importância fundamental do aumento dos salários para a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e das suas famílias, para o crescimento económico do País e em particular dos Açores.
Neste sentido, não podemos ignorar a importância dos aumentos salariais no combate à pobreza, designadamente a pobreza laboral. No atual quadro, em que o mercado de trabalho regional assenta essencialmente num modelo de baixos salários e em está enraizada a precariedade laboral, ter um emprego deixou de ser suficiente para afastar a pobreza. Não faz sentido falar de crescimento económico sem que esse crescimento se traduza numa justa e equilibrada distribuição da riqueza gerada, como não faz qualquer sentido falar de emprego, apenas para fins estatísticos, mas com vínculos precários e sem direitos. Não é essa a economia que defendemos, não é esse, seguramente, o crescimento económico a que os açorianos aspiram e têm direito.
Defendemos a par do aumento dos salários, que é fundamental acelerar o debate com vista à implementação de medidas que contribuam para o desbloqueamento da contratação colectiva, nomeadamente na alteração das normas de caducidade e a reposição do princípio do tratamento mais favorável, pelos reflexos que produz nas remunerações, evitando assim que os salários situados na parte inferior das tabelas salariais a sejam absorvidos pelos aumentos do salário mínimo.
O aumento dos salários em geral, é um investimento que beneficia a economia e a Região. A melhoria dos rendimentos dos trabalhadores e das famílias açorianas estimula o consumo, o que contribui para o aumento da produção e das vendas das empresas, a criação de mais emprego e o crescimento da economia.
Ao mesmo tempo, este aumento tem também efeitos positivos no crescimento das contribuições para a segurança social, ajudando a melhorar a sustentabilidade financeira do sistema.
Em 2019, a maioria das entidades patronais nos Açores teimaram em manter os baixos salários, continuaram os problemas com a falta de pagamentos de remunerações e subsídios; a precariedade laboral é um flagelo; crescem as desregulações dos direitos laborais e as alterações ilegais de horários de trabalho; a insuficiência de condições de segurança e saúde no trabalho é preocupante; a escassez de formação profissional é assustadora; a discriminação salarial entre homens e mulheres devia-nos envergonhar a todos.
Lamentavelmente a Contratação Colectiva que devia ser a mola impulsionadora para alterar o atual paradigma laboral, não tem correspondido às legitimas aspirações dos trabalhadores e em alguns casos, os contratos celebrados por sindicatos não filiados na CGTP/IN levaram mesmo à perda de direitos por parte dos trabalhadores em sectores em evidente crescimento.
É essencial tomar medidas urgentes para inverter a actual situação e a contratação colectiva é o melhor instrumento de progresso social, mas infelizmente muitos empresários da Região continuam a fugir deste tipo de negociação. Recorrendo a todas as formas de boicote ao efectivo exercício de negociação colectiva, incluindo a utilização da caducidade como instrumento de chantagem, o que se reflectiu no bloqueamento de muitos processos negociais.
Este panorama foi agravado nos últimos anos com a não publicação da maioria das portarias de extensão. A extensão da convenção de um dado sector a todas as empresas e a todos os trabalhadores, que no seu âmbito e área exercem actividade, confere aos salários a natureza de salários mínimos do sector, o que é uma forma de complementar o Salário Mínimo Nacional.
A contratação colectiva constitui, pois, um instrumento de igualdade e de combate à exclusão social, valendo a pena referir que a OCDE reconhece que o aprofundamento das desigualdades na distribuição do rendimento está relacionado com reformas e mudanças institucionais no mercado de trabalho, incluindo com um menor impacto dos salários mínimos.
São muito poucas as empresas que proporcionam formação aos seus trabalhadores (7,88% em 2017 face a 8,71% em 2011), tendo participado em acções de formação contínua cerca de 35 milhares de trabalhadores (37% dos TPCO), o que significa que os restantes não tiveram formação.
Uma vez mais, a qualificação e formação profissional dos trabalhadores açorianos foi descurada. O sector privado voltou a não cumprir com o estabelecido na legislação laboral e o Governo Regional dos Açores, ao estabelecer uma acção de formação de dois em dois anos para os trabalhadores da Administração Regional, não só está a inviabilizar a qualificação destes trabalhadores, como está a dar uma péssima referência ao sector privado. Para a USAH e para o SITACEHT/AÇORES, a formação tem de ser uma prioridade e não uma mera opção.
Não basta dizer que os recursos humanos são essenciais, é preciso dotá-los de meios e conhecimentos. É preciso alterar o paradigma, a formação profissional não pode ser vista como um custo, mas, sim, como um investimento.
Em termos de meios, de condições de trabalho e de segurança e saúde no trabalho, os Açores continuam a ser das piores regiões do País, registando todos os anos acidentes mortais de trabalho.
Angra do Heroísmo, 22 de junho, de 2020