A propósito da recente polémica, lançada por PSD e CDS, sobre o Despacho que estabelece medidas administrativas a adotar pelas escolas, de forma a ser respeitado o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o direito à proteção das caraterísticas sexuais de cada pessoa, a FENPROF considera que o mesmo só pecou por tardio – um ano depois da publicação da lei, em pleno período de férias e a duas semanas do reinício da atividade das escolas – e aparentemente disfarçado pelo ruído da publicação das listas de colocação de docentes. Merecia outro destaque, pois trata-se de um despacho que dá resposta ao disposto na Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, e que, mais importante do que a questão estritamente legal, deverá dar resposta a uma realidade que não pode ser ignorada e a que, em algumas escolas, professores e os seus órgãos de gestão têm procurado dar a devida atenção, apesar, até agora, de não terem tido o necessário apoio.
Não é verdade que a aplicação deste despacho potencie fenómenos de bullying, eles são potenciados, isso sim, quando a sociedade ou a escola ignoram a realidade, deixando mais expostas, logo, mais fragilizadas, as minorias, sejam elas quais forem. Acresce que, ao contrário de um, infelizmente, grande número de adultos, as crianças e jovens estão muito mais habilitados a lidar com a diferença, sabendo, não apenas, integrar, mas incluir.
Aliás, sobre questões de género, a escola portuguesa tem ainda um grande caminho a percorrer. Isso é válido em relação aos alunos, mas, também, ao pessoal docente e não docente. É, pois, importante que sejam dados os primeiros novos e significativos passos, não podendo deixar de se questionar sobre o que pretende o CDS quando, em relação a esta matéria, afirma que o despacho obriga as escolas a prosseguir um caminho limitando a possibilidade de ter o seu próprio projeto educativo. Entenderá aquele partido que, em relação a uma questão destas, a escola deverá poder discriminar e/ou excluir como, aliás, fazem alguns colégios, por exemplo, em relação a determinadas realidades?
Agora, não basta publicar o despacho e atribuir às escolas a responsabilidade de o cumprir. É necessário criar condições para que o mesmo se cumpra, o que, como o próprio despacho estabelece, passa por: prevenir e promover a não discriminação; detetar e intervir sobre situações de risco; proteger adequadamente a identidade de género, expressão de género e das caraterísticas sexuais das crianças e dos jovens; promover formação para docentes e demais profissionais das escolas.
Para que tudo isto possa acontecer são necessárias medidas que compete ao Ministério da Educação ter em conta, tais como a criação de tempos específicos para a formação (indispensável) que não aumentem ainda mais a sobrecarga horária dos docentes, bem como reforçar o número de assistentes operacionais (devidamente qualificados) e, em muitos casos, reforçar outros recursos, designadamente físicos, das escolas. A não ser assim, como habitualmente, se algo correr mal, o dedo será apontado aos professores e aos responsáveis das escolas, o que seria absolutamente injusto.