CGTP-IN
Segurança e a saúde no trabalho
armandofariasARMANDO FARIAS
Membro do Conselho Nacional

ARMANDO FARIAS

Membro do Conselho Nacional

 

 

O programa de acção que é proposto ao Congresso coloca a qualidade do emprego como uma questão central e decisiva para o presente e o futuro do país, sem a qual não serão resolvidos nem os problemas económicos e de desenvolvimento que ele enfrenta nem os problemas sociais que afectam gravemente a vida dos trabalhadores.

 

É um facto, e ninguém ignora, que à má qualidade do emprego estão associadas as más condições em que o trabalho é prestado, nas suas múltiplas dimensões, e que estas estão na origem das muitas centenas de milhar de acidentes de trabalho e de doenças profissionais que ocorrem todos os anos em Portugal.

 

As estatísticas, ainda que subavaliadas, mostram que a sinistralidade laboral não tem diminuído significativamente, e até recrudesceu em alguns sectores de actividade: 

  • No período 2000-2006 foram registados mais de 2 milhões de acidentes de trabalho, os quais provocaram a morte de 2.400 trabalhadores;
  • Quanto a doenças profissionais, continua a não haver indicadores, mas tendo em conta que os processos entrados nos tribunais registaram um aumento superior a 100% nos últimos cinco anos, então podemos ter uma ideia de como se têm agravado os problemas em termos da saúde ocupacional;

 

Esta mancha negra que envergonha o país traduz-se numa enorme perda de capacidades produtivas (tenha-se em atenção que só no período atrás referido de 2000-2006 as ausências ao trabalho devido a acidentes atingiu o número astronómico de 55 milhões de dias de trabalho perdidos); também em avultados custos para a sociedade (recordemos que há 15 anos atrás, quando foi elaborado o livro verde da sinistralidade laboral em Portugal, já se estimava em 600 milhões de contos os custos directos e indirectos da sinistralidade); mas, principalmente, e acima de tudo isto está o imenso rol de consequências dramáticas para tantos e tantos milhares de vítimas e suas famílias.

 

Camaradas, esta situação tem causas e tem responsáveis. Ela deve-se sobretudo ao generalizado incumprimento das normas de prevenção e de protecção da segurança e saúde no trabalho, por insuficiente fiscalização e falta de vontade política para as fazer cumprir; à proliferação de trabalho precário e ilegal e à imposição crescente de horários de trabalho excessivamente prolongados e ritmos acelerados de trabalho; ao diminuto investimento na formação dos trabalhadores, que muitas vezes conhecem insuficientemente o trabalho e os respectivos riscos devido a não serem correctamente informados e preparados nesse domínio; ao mau funcionamento, ou mesmo inexistência, dos serviços de prevenção nas empresas, devido à irresponsabilidade da classe patronal que teima em considerar a prevenção dos riscos como um custo que é preciso evitar.

 

Mas como se isto não fosse bastante, nós verificamos que o incumprimento das normas de prevenção e protecção da segurança e saúde tem sido potenciado por um sentimento geral de impunidade. O facto de as condutas violadoras das empresas (que geram os acidentes de trabalho, provocam mortes e incapacidades) não serem objecto de um juízo de desvalor ou censura ética suficientemente forte, têm contribuído para fomentar a ideia da fatalidade dos acidentes de trabalho, que acabam por ser considerados como ocorrências lamentáveis, mas pelas quais ninguém é realmente responsabilizado.

 

As mudanças na sociedade e na vida laboral não eliminaram os riscos no trabalho nem fizeram diminuir as taxas de incidência de acidentes e de doenças relacionadas com o trabalho, particularmente elevadas em certos sectores tradicionais, como a construção civil, a agricultura e a indústria transformadora.

 

Entretanto, todos estes problemas estão a ser fortemente agravados pelo desenvolvimento de novas formas de organização e produção, designadamente com a imposição de múltiplas formas atípicas de emprego, a utilização das cadeias de contratação e subcontratação, a introdução de inúmeras modalidades flexíveis de organização do tempo de trabalho, a gestão de mão-de-obra individualizada e baseada numa obrigação desumana de resultados, etc., etc.

 

Estudos realizados pela Fundação Europeia para as Condições de Vida e de Trabalho e pelo Observatório Europeu dos Riscos referem que a prevalência das lesões músculo-esqueléticas adquiridas no ambiente de trabalho não tem parado de crescer, e prevêem que o stress profissional e outras patologias associadas a factores de risco psicossociais, assim como as doenças provocadas pela exposição às substâncias químicas, vão ter um crescimento muito acentuado.   

 

Particularmente vulneráveis encontram-se os jovens trabalhadores e os emigrantes, os quais são geralmente utilizados em sectores de actividade de mais elevado risco e realizam as tarefas mais penosas, perigosas e em piores condições; recebem menos ou mesmo nenhuma informação e formação sobre os riscos profissionais a que estão sujeitos; têm mais restrições no acesso aos serviços de prevenção e aos serviços médico-sanitários essenciais; têm mais dificuldades em organizarem-se sindicalmente e a exercerem efectivamente os direitos de participação e representação em matéria de saúde, higiene e segurança no trabalho.

 

Há ainda a salientar que a crescente participação das mulheres no emprego introduz uma dimensão nova no domínio da saúde e segurança no trabalho, uma vez que as mulheres têm especificidades importantes em relação ás doenças profissionais.

 

Aliás, as mulheres para além de serem as que em muitas situações mais expostas estão a certos riscos profissionais, têm por outro lado muitas dificuldades em conjugar o trabalho assalariado com o trabalho doméstico, tornando-se nas principais vítimas de exclusão e da precariedade.

É por tudo isto, porque está cientifica e estatisticamente demonstrada a correlação que existe entre o aumento das diversas formas de precariedade impostas aos trabalhadores e o aumento dos índices de frequência de acidentes e de doenças profissionais relacionadas com o trabalho, que mais se torna incompreensível que de entre as propostas que o patronato reclama ao Governo para que sejam introduzidas no código do trabalho, estejam precisamente aquelas que visam impor a precariedade como regra; ao mesmo tempo que seria criado um sistema de flexibilidade de horários e de mobilidade funcional e geográfica que deixaria os trabalhadores completamente desarmados e indefesos face à imposição patronal de intensificar e alargar praticamente sem limites os horários de trabalho, e bem assim, de impor todo o tipo de arbitrariedades.

 

Se caso o patronato viesse a alcançar aqueles objectivos, isso significaria não só um brutal ataque aos direitos dos trabalhadores, mas também uma tremenda machadada no sistema de prevenção de riscos profissionais, pelo qual temos lutado para que seja desenvolvido e consolidado. Mas porque esses mesmos objectivos colidem frontalmente com o cumprimento das leis que respeitam à prevenção da segurança e da saúde dos trabalhadores o Governo, se porventura viesse a adoptar uma tal monstruosidade estaria então a assumir o facto gravíssimo de, em nome do Estado Português, violar ele próprio as leis nacionais e internacionais neste domínio, e como tal, teria de ser responsabilizado politicamente, mas não só, pelas consequências dos seus actos.     

 

Camaradas, o que o país precisa e os trabalhadores exigem, não é mais precariedade nem piores condições de trabalho que lesam gravemente a saúde das pessoas. Pelo contrário, no actual contexto o combate firme à precariedade laboral constitui factor determinante para reduzir os riscos profissionais, sendo igualmente urgente e necessário que as entidades públicas competentes nesta matéria comecem finalmente a agir com firmeza, fazendo cumprir a lei, sem tréguas, de modo a deixar bem claro às empresas, de uma vez por todas, que a protecção da segurança e saúde dos trabalhadores é uma prioridade absoluta, envolvendo o respeito por direitos fundamentais como o direito à vida, à saúde e á integridade física.

 

A Constituição da República Portuguesa reconhece aos trabalhadores o direito à organização, prestação e protecção do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a conciliação da actividade profissional com a vida familiar e a permitir que a realização pessoal e profissional possa encontrar na qualidade de vida do trabalho, particularmente a que é favorecida pelas condições de saúde, higiene e segurança, uma matriz fundamental para o seu desenvolvimento.

É, pois, necessário fazer cumprir a Constituição!

A segurança e a saúde no trabalho tem de constituir uma prioridade da intervenção e acção sindical e, nesse sentido, é preciso desenvolver uma forte acção reivindicativa por melhores condições de trabalho, exigir o cumprimento rigoroso da lei para que sejam implementadas as medidas de controlo e preventivas, assim como os direitos de protecção específicos, incluindo os direitos relativos à reabilitação e reinserção dos trabalhadores vitimados por acidente de trabalho ou doença profissional. 

 

Em suma, É PRECISO INTENSIFICAR A LUTA!

 

Viva o XI Congresso!

Vivam os Trabalhadores!

 

 

Lisboa, 16 de Fevereiro de 2008

 
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