Despenalização da IVG e o Referendo Nacional de 11 de Fevereiro de 2007

POSIÇÃO DA CGTP-IN  SOBRE A DESPENALIZAÇÃO DA IVG E O REFERENDO NACIONAL DE 11 DE FEVEREIRO DE 2007

 

Em Movimento pelo SIM!
A força de quem trabalha!

 

POR QUE ESTAMOS EM “MOVIMENTO PELO SIM!”

A Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens/CGTP-IN (CIMH/CGTP-IN) tomou conhecimento do anúncio do Senhor Presidente da República, a propósito da convocação do Referendo Nacional, a realizar no dia 11 de Fevereiro de 2007, sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez (IVG), até às 10 semanas, por opção da mulher, em estabelecimento de saúde público ou legalmente autorizado.

A CIMH/CGTP-IN entende que esta é uma questão de grande importância, considerando a existência de uma norma legal desadequada da realidade social, que empurra as mulheres que necessitam interromper uma gravidez para o aborto clandestino, com consequências para a sua saúde sexual e reprodutiva e para a própria vida, sujeitando-as (em particular, às de mais fracos recursos económicos), à estigmatização social, à perseguição e à prisão.

A CIMH/CGTP-IN considera, igualmente, que, dizendo respeito às mulheres, este é um problema da sociedade e, neste sentido, exige um debate alargado sobre o tema concreto que irá ser referendado.

A CGTP-IN e a sua estrutura sindical sempre se empenharam na resolução deste grave problema social, quer por iniciativa própria, quer integrando movimentos pela despenalização do aborto, tendo presente, designadamente, que esta é uma reivindicação assumida desde o seu 1º Congresso. Na sequência de iniciativas anteriores, a CIMH/CGTP-IN, em Fevereiro do corrente ano, integrou o Movimento pelo SIM À DESPENALIZAÇÃO “A Mulher decide, A Sociedade respeita, o Estado garante”, que recolheu mais de 41 000 assinaturas, num abaixo-assinado entregue ao Senhor Presidente da Assembleia da República, onde se reclamava uma lei de despenalização.

Numa postura responsável e coerente, e tendo presente a necessidade de intervir no debate e no esclarecimento das trabalhadoras e dos trabalhadores nos locais de trabalho para a sua participação massiva e pelo seu voto pelo SIM! no Referendo, a CGTP-IN e a CIMH/CGTP-IN irão participar activamente na campanha a favor do SIM!, incentivando à participação alargada no esclarecimento, designadamente, por via da constituição e propositura formal, junto da Comissão Nacional de Eleições, de Grupos de Cidadãos para intervirem na Campanha, com vista ao voto consciente pelo SIM!

Por iniciativa própria e integrada no Grupo de Cidadãos e Cidadãs Eleitores “Em Movimento pelo Sim! A Mulher decide, A Sociedade respeita, o Estado garante”, tornado público, em Conferência de Imprensa, em 29 de Novembro de 2006, a CIMH/CGTP-IN irá dinamizar uma intensa Campanha de esclarecimento assente nas seguintes razões fundamentais:

  

Razões pelas quais defendemos o sim à despenalização da IVG

A despenalização da IVG é uma questão de justiça e de respeito pela dignidade social das mulheres. O direito penal não pode ser um direito moral.

A lei existente é inadequada face à realidade e não resolve o problema do aborto clandestino, que constitui uma flagrante injustiça para as mulheres e uma vergonha para o país. É uma lei injusta porque não responde às principais razões que determinam o recurso à IVG – as falhas dos métodos contraceptivos e os motivos de natureza económica e social -, empurrando as mulheres para o aborto clandestino e penalizando, sobretudo, as que têm menos recursos económicos e que não podem recorrer a clínicas privadas, designadamente no estrangeiro (só entre 1996 e 2002, cerca de 9 000 mulheres portuguesas interromperam a gravidez em clínicas espanholas), submetendo-as, ainda, à perseguição judicial e ao risco de prisão.

Defendemos uma lei que despenalize a IVG, uma lei que não obrigue nenhuma mulher contra a sua vontade, nem afronte a consciência individual de cada um/uma e que afaste aquilo que, na prática, é hoje a imposição, na lei penal, dos códigos morais de alguns a todos os cidadãos.

Defendemos uma lei que, à semelhança do que se passa na maioria esmagadora dos Estados-membros da União Europeia - onde a IVG é permitida por solicitação da mulher - aceite as razões das mulheres, respeitando a sua opção e a sua dignidade e atendendo às condições económicas, sociais e familiares e/ou às circunstâncias em que ocorreu a concepção.

A opção de interromper uma gravidez não é uma decisão fácil. Respeitamos a decisão da mulher

Respeitamos as razões que, em determinadas circunstâncias, as mulheres terão para optar pela IVG, porque consideramos que esta não é uma decisão fácil e pensamos que algumas mulheres são empurradas para esta opção por razões de natureza económica e familiar, às quais não são indiferentes as suas condições de vida e de trabalho.

As mulheres trabalhadoras, e as jovens em particular, que são discriminadas no acesso ao emprego, nas carreiras, nos salários e nos direitos, que são despedidas ou não vêem o contrato de trabalho renovado porque são mães ou engravidam; as que têm baixos salários, trabalho cada vez mais precário, que são afectadas pelo desemprego (no último trimestre de 2006, a taxa de desemprego das mulheres entre os 25 e os 34 anos era de 12,1% e dos 35 aos 44, de 7,3%), sem condições de independência económica, sem acesso a infra-estruturas sociais de apoio à criança e à família, sem rendimentos familiares suficientes para criar e educar os seus filhos, devem poder evocar razões desta natureza para interromper uma gravidez indesejada.

Respeitamos a decisão das mulheres que são vítimas das redes clandestinas de tráfico sexual e da prostituição; as que são violadas e não podem fazer prova dessa violação, entendendo que devem ser ouvidas e atendidas as razões que lhes assistem para interromper a gravidez, determinadas pelas condições em que vivem, respeitando a sua dignidade pessoal e em defesa do direito à vida, em condições de dignidade e segurança, das crianças.

O Estado deve garantir as condições para proteger a saúde reprodutiva das jovens e das mulheres. A IVG não é um método contraceptivo

O Estado deve garantir, através do Serviço Nacional de Saúde, as condições de segurança para a saúde das mulheres que decidem recorrer a uma IVG e o desenvolvimento de políticas adequadas de educação sexual e de planeamento familiar. A IVG não é um método contraceptivo mas o último recurso.

A segurança para a saúde das mulheres não é uma questão privada. E as mulheres que recorrem à IVG não devem ser discriminadas nos cuidados de saúde, antes e depois do acontecimento. Estes cuidados implicam também o acompanhamento e aconselhamento psicológico de que as mulheres necessitem.

Por outro lado, o facto de uma mulher ou de uma jovem poder ser devidamente assistida e acompanhada, desencadeia um processo de aconselhamento e esclarecimento acerca da sua saúde reprodutiva e de um melhor conhecimento sobre o método contraceptivo que deve utilizar, a fim de evitar engravidar e recorrer ao aborto. Acresce que Portugal apresenta uma das mais elevadas taxas de gravidez na adolescência, estimando-se que uma em cada 200 jovens, entre os 15 e os 19 anos, já tenha abortado.

O Estado tem que assumir, na prática, as suas responsabilidades, adequando o quadro legal à realidade social e colmatando as insuficiências na prevenção da gravidez não desejada, designadamente por via do reforço dos serviços e consultas de planeamento familiar nos Centros de Saúde e em outras unidades de saúde; tem que cumprir e fazer cumprir a lei em matéria de educação sexual, desenvolvendo-a de forma integrada nas escolas e sensibilizando para a temática no seio da família. Estas são responsabilidades das quais o Estado não se pode eximir, deixando as mulheres e as jovens que engravidam, sem o desejarem, à mercê do aborto clandestino e das suas consequências.

O acesso aos cuidados de saúde é um direito de todos os cidadãos e cidadãs.

A CGTP-IN e a CIMH/CGTP-IN consideram imprescindível que o Estado desenvolva uma política de saúde assente num Serviço Nacional de Saúde público, universal e tendencialmente gratuito, que garanta o acesso efectivo de todos os cidadãos e cidadãs à prevenção da doença e aos cuidados de saúde e, designadamente, aos serviços e consultas de saúde materno-infantil. Condenam, por isso, o encerramento de maternidades e de outras unidades de saúde, o pagamento de taxas nos internamentos e cirurgias ou a redução da comparticipação do Estado nos medicamentos.

A CGTP-IN reclama uma política que garanta a efectividade do valor social da maternidade e da paternidade.

A CGTP-IN e a CIMH/CGTP-IN consideram que é dever do Estado, conforme a Constituição da República Portuguesa, cumprir e fazer cumprir as normas legais de protecção da maternidade e paternidade e proteger a família, promovendo a sua independência económica e social e criando infra-estruturas de apoio social como creches e infantários, que respondam às necessidades das famílias. Compete, também, ao Estado cooperar com os pais e as mães na protecção e educação dos seus filhos, principalmente, nos primeiros anos de vida.

A CGTP-IN e a CIMH/CGTP-IN reclamam do Governo políticas e medidas que valorizem a função social da maternidade e da paternidade e estimulem a natalidade, nomeadamente, tendo em vista a melhoria dos salários e das condições de vida e de trabalho e fazendo cumprir a lei nos locais de trabalho onde, diariamente, se assiste à violação de direitos das mães e dos pais, que têm repercussões na vida familiar das pessoas e prejudicam a relação de apoio e afecto tão necessário ao desenvolvimento das crianças.

DESPENALIZAR A IVG É GARANTIR E RESPEITAR UM QUADRO JURÍDICO DEMOCRÁTICO; É DIGNIFICAR AS MULHERES; É CONTRIBUIR PARA UMA MATERNIDADE E PATERNIDADE CONSCIENTES E RESPONSÁVEIS!

Lisboa, 6 de Dezembro de 2006